O natal, meu pai, Glaucia e eu.
Já começaram a aparecer na TV e rádio as propagandas alusivas a época do natal. Eu temia por isso, pois o natal sempre foi uma época maravilhosa pra mim.
O natal me conquistou bem antes que eu pudesse entender seu significado. Meu pai apesar de, na maioria do tempo, se mostrar pouco afetivo, tinha em seu coração algo que o fazia, na véspera de natal, ir ao centro da cidade comprar presentes pra mim e meus irmãos.Era maravilhoso ganhar aqueles velotros, bolas, robozinhos, pinobol e sair na manhã do dia 25 pra mostrar para os amigos da vizinhança. Toda a criançada saia com os presentes que ganhara e, no caso dos velotrols, alinhávamos nossas máquinas na rua e partíamos para nossas competições de velocidade, deixando atrás de nós nossas mães apavoradas com a rapidez com que corríamos e o medo de que caíssemos e nos machucássemos, o que quase sempre acontecia e voltávamos ralados pra casa. Mas era muito bom!
Aqueles brinquedos de natal eram preciosos pra mim, pois como meu pai tinha poucos gestos de carinho pra com a gente, eles eram uma prova concreta do afeto dele por nós.
No natal tudo parava, os pais ficavam com a gente em casa, viamos nossos primos, tios e avós. Todos de bom humor, mais pacientes e tolerantes conosco, crianças, do que de costume. As propagandas e programas na TV eram coloridos em minha TV preto e branco. As ruas e lojas enfeitadas e eu morava em Belo Horizonte. Naquele tempo BH era mais humana, despoluída e alegre. E era também menos violenta. A porta de minha casa constantemente se abria e entrava alguém da vizinhança, um parente ou um amigo. Tinha gente entrando e saindo e raramente ficávamos sozinhos.
Eu era feliz e eu sabia. Quando eu tinha treze anos as celebrações de natal terminaram bruscamente. Meus pais se separaram e a aproximação do primeiro natal após a separação me angustiava. Apesar de distante, meu pai estava bem e eu passava a integrar uma família nova aqui em Brasília, me refiro a igreja. O natal chegou, cantei no coral e participei do culto natalino. Depois, fui a casa de um irmão que me convidou ao me ver sozinho e sem ter pra onde ir. Dali por diante meus natais foram na igreja. Cheguei a enfeitar minha casa com árvore e outras coisas, pois meus irmãos mais novos poderiam apreciar tudo aquilo. Eu comprava cartões de natal pra todo mundo e presentes pra família. No entanto, sonhava com o natal que um dia comemoraria com meus filhos. E o dia chegou.
Me casei com Jane que não dava muita bola pra enfeites de natal. Vitor chegou e não se ligava muito também, mas o melhor estava por vir. Glaucia nasceu e assim que começou a entender um pouco do que era o natal, vi que havia encontrado a parceira dos meus sonhos pra curtir o natal. Glaucia ganhou da vó Edith uma árvore dessas lindas que vendem em lojas. Passamos a enfeitá-la com os cartões que recebíamos e coisinhas que Glaucia comprava nas lojas de 1,99. Fazíamos nossa lista de presentes e separávamos cada presente para cada pessoa da lista. Íamos aos shoppings ver a decoração natalina e fazer fotos, e nesses passeios viamos também o que poderíamos acrescentar como enfeite pra nossa casa. Eu colecionava durante o ano músicas natalinas que começava a tocar de modo que o som enchesse a casa a partir do dia primeiro de dezembro. Comprávamos guloseimas natalinas e fazíamos rabanada com a receita do Sr. Vicente.
Na realidade, todos os anos, quando as cigarras começavam a cantar, eu já começava a me animar com o fato de que estava chegando o natal.
Nesse ano de 2009, quando ouvi as cigarras cantando, tive vontade de gritar para que parassem, mas achei que elas pudessem estar cantando pra Jesus voltar e não pela aproximação do natal, e assim me consolei e pedi a elas que continuassem.
Quando voltei ao apartamento em que moramos até antes de o Senhor levar minha florzinha amarela, enquanto Jane separava as coisas que íamos levar, ouvi alguém perguntando a Jane o que devia fazer com uma árvore de natal que encontrará guardada no armário. Me desesperei naquela hora com o que estava acontecendo, mas pedi a Deus que me ajudasse e em silêncio ouvi que a árvore seria jogada fora, pois estava bem velhinha e gasta.
Em março desse ano Deus levou meu pai, aquele que me fez amar tanto o natal, e em junho levou aquela que fez dos meus natais as melhores épocas de minha vida.E agora?
E agora Glaucia e meu pai conhecem algo infinitamente superior a celebração do natal. Algo mais belo, saboroso, encantador e real. Eles tem a presença do próprio Cristo. Perto do que eles usufruem, tudo que já usufrui parece pouco, quase nada. Não choro por eles, e claro.
A saudade é o amor que fica, já disse um garotinho. Não sei como será esse nem meus outros natais, quantos Deus permitir. Tudo que antes era bom, agora doi. Acho que preciso sentir essa dor, sem aprofundá-la, mas procurando amenizá-la se possível.
Não repare se eu não atender ao seu convite para celebrações natalinas ou se nesse ano eu não lhe presentear. Sentimentos não se explicam nem se submetem ao frio julgamento da razão. Posso não me conduzir por minhas emoções, mas desprezá-las, não. Pessoas que se permitam ter sentimentos, ainda que tristes, hoje em dia são bem difíceis de encontrar. Parece que a dureza da vida fez com que a maioria das pessoas desconsidere as coisas do coração e privilegiem os aspectos racionais. Temos assim um cristianismo que propõem todo o tempo soluções para as dores da vida, mas que não quer se identificar com a dor dos que sofrem. É como o médico que nos vê chorando de dor, olha nosso prontuário médico, prescreve algo, se despede e sai do quarto. Fez o que era racionalmente necessário, mas ao passar por nosso quarto, não passou por nós, pelo contrário. Assim, se multiplicam as frases de pretenso consolo do tipo: -- Isso vai passar! Junto com esse tipo de frase pareço ouvir: -- Quando tudo passar, estaremos aqui te esperando. Até lá, você segue sem nós. Claro que há exceções. Não fossem elas, esses anjos que Deus tem enviado, não sei como estaríamos. Pudesse, eu me mudaria para a casa ao lado deles.
Tentar escrever o que sinto me ajuda a elaborar tudo isso, me faz ver quem sou e como estou. Lembrar o que Deus escreveu pra mim me faz sempre lembrar de quem Ele é e sempre será. Me faz crer que vale a pena prosseguir apesar da dor.
Não mais vou esperar pelo natal, essa celebração que nem é recomendada pela Bíblia. Passo a esperar do fundo de minh'alma pela volta de Jesus. Faz muito mais sentido.
Mas não custa pedir, nesse natal me presenteie com suas orações por Jane e Vitor. Mesmo quando o natal passar, ainda me presenteie assim.
Deus abençoe suas celebrações natalinas, é o que desejo de coração. Curta esses momentos tanto quanto eu curti.
O natal me conquistou bem antes que eu pudesse entender seu significado. Meu pai apesar de, na maioria do tempo, se mostrar pouco afetivo, tinha em seu coração algo que o fazia, na véspera de natal, ir ao centro da cidade comprar presentes pra mim e meus irmãos.Era maravilhoso ganhar aqueles velotros, bolas, robozinhos, pinobol e sair na manhã do dia 25 pra mostrar para os amigos da vizinhança. Toda a criançada saia com os presentes que ganhara e, no caso dos velotrols, alinhávamos nossas máquinas na rua e partíamos para nossas competições de velocidade, deixando atrás de nós nossas mães apavoradas com a rapidez com que corríamos e o medo de que caíssemos e nos machucássemos, o que quase sempre acontecia e voltávamos ralados pra casa. Mas era muito bom!
Aqueles brinquedos de natal eram preciosos pra mim, pois como meu pai tinha poucos gestos de carinho pra com a gente, eles eram uma prova concreta do afeto dele por nós.
No natal tudo parava, os pais ficavam com a gente em casa, viamos nossos primos, tios e avós. Todos de bom humor, mais pacientes e tolerantes conosco, crianças, do que de costume. As propagandas e programas na TV eram coloridos em minha TV preto e branco. As ruas e lojas enfeitadas e eu morava em Belo Horizonte. Naquele tempo BH era mais humana, despoluída e alegre. E era também menos violenta. A porta de minha casa constantemente se abria e entrava alguém da vizinhança, um parente ou um amigo. Tinha gente entrando e saindo e raramente ficávamos sozinhos.
Eu era feliz e eu sabia. Quando eu tinha treze anos as celebrações de natal terminaram bruscamente. Meus pais se separaram e a aproximação do primeiro natal após a separação me angustiava. Apesar de distante, meu pai estava bem e eu passava a integrar uma família nova aqui em Brasília, me refiro a igreja. O natal chegou, cantei no coral e participei do culto natalino. Depois, fui a casa de um irmão que me convidou ao me ver sozinho e sem ter pra onde ir. Dali por diante meus natais foram na igreja. Cheguei a enfeitar minha casa com árvore e outras coisas, pois meus irmãos mais novos poderiam apreciar tudo aquilo. Eu comprava cartões de natal pra todo mundo e presentes pra família. No entanto, sonhava com o natal que um dia comemoraria com meus filhos. E o dia chegou.
Me casei com Jane que não dava muita bola pra enfeites de natal. Vitor chegou e não se ligava muito também, mas o melhor estava por vir. Glaucia nasceu e assim que começou a entender um pouco do que era o natal, vi que havia encontrado a parceira dos meus sonhos pra curtir o natal. Glaucia ganhou da vó Edith uma árvore dessas lindas que vendem em lojas. Passamos a enfeitá-la com os cartões que recebíamos e coisinhas que Glaucia comprava nas lojas de 1,99. Fazíamos nossa lista de presentes e separávamos cada presente para cada pessoa da lista. Íamos aos shoppings ver a decoração natalina e fazer fotos, e nesses passeios viamos também o que poderíamos acrescentar como enfeite pra nossa casa. Eu colecionava durante o ano músicas natalinas que começava a tocar de modo que o som enchesse a casa a partir do dia primeiro de dezembro. Comprávamos guloseimas natalinas e fazíamos rabanada com a receita do Sr. Vicente.
Na realidade, todos os anos, quando as cigarras começavam a cantar, eu já começava a me animar com o fato de que estava chegando o natal.
Nesse ano de 2009, quando ouvi as cigarras cantando, tive vontade de gritar para que parassem, mas achei que elas pudessem estar cantando pra Jesus voltar e não pela aproximação do natal, e assim me consolei e pedi a elas que continuassem.
Quando voltei ao apartamento em que moramos até antes de o Senhor levar minha florzinha amarela, enquanto Jane separava as coisas que íamos levar, ouvi alguém perguntando a Jane o que devia fazer com uma árvore de natal que encontrará guardada no armário. Me desesperei naquela hora com o que estava acontecendo, mas pedi a Deus que me ajudasse e em silêncio ouvi que a árvore seria jogada fora, pois estava bem velhinha e gasta.
Em março desse ano Deus levou meu pai, aquele que me fez amar tanto o natal, e em junho levou aquela que fez dos meus natais as melhores épocas de minha vida.E agora?
E agora Glaucia e meu pai conhecem algo infinitamente superior a celebração do natal. Algo mais belo, saboroso, encantador e real. Eles tem a presença do próprio Cristo. Perto do que eles usufruem, tudo que já usufrui parece pouco, quase nada. Não choro por eles, e claro.
A saudade é o amor que fica, já disse um garotinho. Não sei como será esse nem meus outros natais, quantos Deus permitir. Tudo que antes era bom, agora doi. Acho que preciso sentir essa dor, sem aprofundá-la, mas procurando amenizá-la se possível.
Não repare se eu não atender ao seu convite para celebrações natalinas ou se nesse ano eu não lhe presentear. Sentimentos não se explicam nem se submetem ao frio julgamento da razão. Posso não me conduzir por minhas emoções, mas desprezá-las, não. Pessoas que se permitam ter sentimentos, ainda que tristes, hoje em dia são bem difíceis de encontrar. Parece que a dureza da vida fez com que a maioria das pessoas desconsidere as coisas do coração e privilegiem os aspectos racionais. Temos assim um cristianismo que propõem todo o tempo soluções para as dores da vida, mas que não quer se identificar com a dor dos que sofrem. É como o médico que nos vê chorando de dor, olha nosso prontuário médico, prescreve algo, se despede e sai do quarto. Fez o que era racionalmente necessário, mas ao passar por nosso quarto, não passou por nós, pelo contrário. Assim, se multiplicam as frases de pretenso consolo do tipo: -- Isso vai passar! Junto com esse tipo de frase pareço ouvir: -- Quando tudo passar, estaremos aqui te esperando. Até lá, você segue sem nós. Claro que há exceções. Não fossem elas, esses anjos que Deus tem enviado, não sei como estaríamos. Pudesse, eu me mudaria para a casa ao lado deles.
Tentar escrever o que sinto me ajuda a elaborar tudo isso, me faz ver quem sou e como estou. Lembrar o que Deus escreveu pra mim me faz sempre lembrar de quem Ele é e sempre será. Me faz crer que vale a pena prosseguir apesar da dor.
Não mais vou esperar pelo natal, essa celebração que nem é recomendada pela Bíblia. Passo a esperar do fundo de minh'alma pela volta de Jesus. Faz muito mais sentido.
Mas não custa pedir, nesse natal me presenteie com suas orações por Jane e Vitor. Mesmo quando o natal passar, ainda me presenteie assim.
Deus abençoe suas celebrações natalinas, é o que desejo de coração. Curta esses momentos tanto quanto eu curti.